4 de fevereiro de 2015

sobre os pingos de carnaval


dia de de iemanjá e o canto veio ressoando do disco que girava na vitrola da sala. lembrou do mar e do vídeo. das palavras que lhe soaram aos ouvidos na beira da praia enquanto as ondas iam e vinham e o sol bailava por trás das nuvens. era verão. era fim. era sol que queimava a pele e gosto de sal na boca. tinha mãos bonitas. um anel em cada dedo do meio. são jorge no esquerdo e atlantis no direito. daqueles que todo mundo tem, sabe? estava no paraíso. e tinha total consciência disso. mãe d'água rainha das ondas sereia do mar. sim, era peixe-gente. baleia. tubarão. mãe d'água. sereia. oxum. iemanjá. água. era daquelas mulheres nas quais se pode confiar. mesmo desconfiando um pouquinho. daquelas que se lançam no mar com uma força que nunca se sabe quando e como elas vão sair dali. daquelas que escabelam os cabelos e ficam com a pele vermelha do sal, do sol, do excesso de verão. daquelas que dançam tortas e cantam fora de ritmo, que sorriem à toa e falam coisas idiotas. daquelas tipo agente sabe? tipo nós há alguns anos atrás. ou hoje. agora. ontem. quem sabe? o tempo é sempre tão relativo pra elas. conseguem se transportar para outra dimensão e voltar como se nada tivesse acontecido. são atrizes. artistas. daquelas que explodem sabe? que não cabem numa caixinha, e muito menos numa cidade. elas precisam perambular por aí. encantar e partir corações. porque nem elas sabem o porquê de sua existência. e nem saberão tão cedo e posso lhe afirmar: não queira saber. não precisa. maria era moça tranquila que vivia entre ervas e plantas na beira do mar. maria menina bonita de cabelos dourados e boca vermelha. lábios carnudos. suculentos. imensos. daqueles que dá vontade de morder e arrancar. tinha um sorriso leve e covinhas pequenas nas bochechas, perto dos olhos. não tinha pelos. tinha medos mas não é hora de falar sobre eles. maria se sentia corajosa e respirava aliviada o novo ano e a nova cidade. não queria ir para nenhum outro lugar e era tão bom se sentir satisfeita ali. queria um monte de coisas mas por incrível que pareça finalmente conseguia respeitar o agora e deixar tudo acontecer naturalmente. parou de apressar os ponteiros e respirar ofegante. maria sentia o vento da cidade sem água. mas ela a cada dia transbordava mais e mais. transpirava água, saciava sedes. maria era moça simpática que sorria demais. falava manso e se magoava facilmente. como um cristal, frágil. sempre. maria quebrava mas nem doía tanto como antes. aprendeu a sobreviver e quer ser feliz. isso basta. era mulher inteligente. senhora de respeito. mãe exemplar. mimada. criança assustada. corajosa, demais. se escondia na casca e saltava pra fora quando o ambiente lhe parecia amigável. e sorte daqueles que lhe viam saltar. maria girava na noite e encantava a pomba gira. gargalhava bem alto e cantava suas canções favoritas com um pingo de suor lhe escorrendo pela testa. transpirava. transbordava. era muito, tanto e tão boa que seria ridículo lhe chamar de modesta. maria sabia. disfarçava, mas sabia. sabia que o mundo ainda tinha muito pra lhe dar e que ela não iria parar tão cedo. aquela gente toda naquela cidade cinza precisa da sua alegria. eles precisam de um pouco de sol. maria deixou o mar e foi se aventurar entre as pedras. entre os pobres seres engolidos pelo trabalho. maria era festa. era música. era carnaval. destoava de todos aqueles prédios e era tão pequena perto deles que mais parecia um pingo perdido no meio da multidão. os pingos se multiplicam e que na cidade seca venha um tsunami bem lindo pra molhar aquele povo. que seja de suor em pleno carnaval! pingos e purpurinas espalhados pela cidade!

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