2 de setembro de 2011

das cartas não lidas

se levantou na manhã ensolarada. a única depois de dias de escuridão. vestiu a camisola e caminhou até a beira da praia. queria sentir o áspero da areia nos pés e depois limpá-los com a salgada água gelada do mar. levou consigo as cartas que nunca havia entregado e treze garrafas de vinho vazias. garrafas esvaziadas nas noites frias de porto alegre. noites de luxúria, de gargalhadas, de música, dúvidas, silêncios e lágrimas. noites de tarot, de magia. uma porção de lembranças bebidas de gute gute em taças e copos de vidro rachados... há mais ou menos um mês havia decidido se mudar para a casa da praia. levara consigo uma mala pequena, somente com roupas leves e confortáveis, cangas e nenhum sapato. não queria que nada lhe prendesse os pés. queria estar preparada para um vento forte que pudesse passar por lá e levá-la consigo. releu carta por carta. as palavras eram bonitas, bobas por vezes... porém sentiu um imenso orgulho de si mesma... e uma tristeza por tudo isso que morreria calado. ela era como um ponto de interrogação, como uma janela aberta pro ar. queria sim ser feliz ao lado de alguém, mas só a sua felicidade não lhe interessava. queria ver os sorrisos, queria ver os olhos brilharem. queria dividir. gargalhadas compartilhadas são muito mais gostosas. e ela já estava cansada... cansada das mesmas histórias, cansada do redemoinho. treze cartas para três amores que se apagaram com o passar do tempo. ao som das ondas do mar ela guardava cada carta dentro de uma das garrafas. antes disso as lia em voz alta, como se fossem uma oração. chorava, sentia falta de ar, e ria ainda com os olhos molhados das lágrimas. sentia arrepios e tudo aquilo era como um momento mágico, como uma viagem de avatar, como se sentir conectada com cada grão de areia, com o céu azul e brilhante, com as nuvens que dançavam sob sua cabeça... era como fazer parte daquele lugar. ali ela se sentia em casa. se sentia planta, se sentia bicho, se sentia sal. sentia os pés afundando na areia macia e o mar que suavemente indo e vindo cantava uma canção serena... olhou pra frente e ficou admirando o horizonte, o sol lhe queimava o rosto e depois das ondas mais profundas ela só enxergava um imenso branco cintilante... o mesmo branco de quando era acordada de um sono bom e os raios invadiam a janela iluminando o corpo nu em cima da cama. a água batia nos pés, suave, refrescante... as ondas a puxavam e o vento a empurrava. tirou a camisola e depois de um leve arrepio saiu correndo mar à dentro. sentia a água nas coxa, no ventre, nos seios... sentia-se leve, flutuando. era como se lhe carregassem. ficou ali por um tempo. as ondas haviam parado e conseguia ficar deitada sendo levada admirando o céu. respirou fundo e se sentiu completa. ali naquele momento ela não precisava de mais nada. estava satisfeita... mergulhou.

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