9 de outubro de 2013

sobre os conselhos da água


de repente, assim como quem não quer nada, foi pega por uma tristeza que lhe cravou o peito como uma flecha. o sangue desceu e escorreu pelas pernas. gotículas vermelhas pingavam no chão de terra. a água do rio era tranquila e suave. imensidão azul. parece que vai chover, talvez amanhã. mas hoje o sol brilha no céu e lhe esquenta o ombro direito. parece primavera, mas é inverno na realidade. sentiu a solidão que há tempos não sentia. sentiu o medo. sentiu a insegurança e a indecisão. não gostou. homenzinhos laranjas caminhavam na beira da praia recolhendo seus restos mortais. estava virando pó e se despindo de tudo de ruim que se encontrava dentro dela. eles tinham sacos pretos nas mãos onde iam colocando seus pedaços. pegaram a vesícula podre, sacudiram os pulmões e foram guardando todas as bitucas que deles caiam. encontraram também um passarinho morto, com as asas cortadas, fios de cabelos brancos, pedaços de unhas mal cortadas, a ponta da língua e uma coleção de lágrimas. pegaram o coração e passaram um pano para tirar a sujeira, depois devolveram ele pra ela. falaram pra ela cuidar melhor dele, se não na próxima vez o colocariam no saco também e daí não lhe restaria mais nada. pelo caminho ia deixando um rastro de gotículas de sangue e aos poucos podia sentir a areia molhada lhe acariciando os pés. já havia se livrado dos sapatos fazia tempo e a água lhe chamava como em um mantra ou uma canção de ninar. a melodia entrava pelos ouvidos e o vento a empurrava carinhosamente para frente... era um daqueles dias em que acordava sentindo demais. sentia tudo e tanto e quase explodia sem saber porquê. o sol lhe fazia bem, era como se estivesse repondo as energias e se enchendo de luz. e realmente estava. a água lhe chama, os pássaros cantam e os automóveis seguem passando na avenida logo atrás... um senhor idoso lhe olhou no fundo dos olhos e disse que é isso mesmo, pra não desistir agora, ainda tem muita coisa pela frente, ainda há que sorrir e chorar bastante... as nuvens dançavam sobre sua cabeça e ao longe escutava o som de patas de cavalo batendo no asfalto... vontade de galopar pra longe com os cabelos ao vento.

(1 de agosto de 2013)

Nenhum comentário:

Postar um comentário